domingo, fevereiro 17, 2013

O ser brasileiro e a música de Elomar Figueira Mello

O fato de ser brasileiro gera um misto de descontentamento e alegria. O descontentamento  fica por conta dos tantos absurdos que acontecem todos os dias em nosso país. O Poderes da República completamente apodrecidos. O jeitinho que é um modo de navegação social. As desigualdades sociais que nos passam a ideia de uma sociedade estamental. A tributação pesada que pagamos e não temos os serviços essenciais - segurança, educação, saúde - a contento. As mentiras que são contadas pela mídia. Os programas crassos que são veiculados e que brutaliza a maior parte dos brasileiros. O fisiologismo partidário. A impressão de impunidade. De que trabalhamos para alimentar uma máquina que nos corta, que nos pune, que nos vilipendia.

A mídia trabalha com a ideia de que somos brasileiros em ano de Copa do Mundo. Naqueles momentos em que um esportista ganha alguma medalha nesses campeonatos internacionais. Ou que aumentará o nosso orgulho quando ganharmos um daqueles incipientes Orcars. Ou ainda seremos melhores quando sediarmos as Olímpiadas. Para isso criaram um bordão decadente: "Sou brasileiro; não desisto nunca". Ser brasileiro é mais do quê essas baboseiras construídas pelo discurso da mídia. 

Somos um país bonito. De natureza privilegiada. De praias belíssimas. De ricas florestas. De rios belíssimos. De chapadões largos, imensos. De cerrado vistoso. Dos alagados do Pantanal. Da imensa e prodigiosa Amazônia. No que tange ao mundo artístico, também não é para menos. Fiz essa digressão inicial, pois tenho ouvido com bastante intensidade as músicas de Elomar, um baiano que se mostra como um dos maiores poetas de nossa terra. Tantos brasileiros não o conhecem. Não sabem quem é esse sujeito de uma simplicidade incomum e com um forte senso de profundidade estética. 

Elomar Figueira
Elomar nos prova que para fazer o belo, que para construir uma obra de arte, não é necessário ler intricados manuais. Abeberar-se de fórmulas acadêmicas. A beleza é como o sopro do vento. É preciso ficar quieto e em silêncio para percebê-la. Hoje, pela manhã, ouvi o disco "Xangai canta Elomar" e algo de uma leveza, de uma sublimidade, invadiu o meu coração. Um riso bobo e uma frase ecoou inevitável: "Meu Deus, que coisa mais linda!" 

O compositor baiano Elomar segue a tradição das cantigas medievais. Seu cancioneiro está repleto da tradição dos reis, que saíam pela Idade Média cantando as belezas do mundo. É tradição das canções de amigo. Elomar apropriou-se dessa linguagem e inseriu nela o calor, os modos populares, a fala, a natureza sinuosa do sertão, eivada por uma espiritualidade que nos faz chorar. Após ouvir Xangai cantar Elomar, fico com a firme convicção de que a obra de Elomar é o espírito da obra de João Guimarães Rosa sendo cantado. 

Um riso abobalhado brota no canto dos lábios após ouvir a música "As curvas do rio" (abaixo); e isso me faz me apegar ainda mais àquilo que de mais belo existe em nossa terra. 










Um comentário:

Carlinus disse...

Comentário do meu amigo Luis Fernando via Facebook:

"Concordo contigo quando aproxima a música de elomar do escritor mineiro, o disco remete mesmo a um sertão reinventado, recriado criando heróis que se perdem nas sendas das memórias linguísticas, de ambos do escritor e do cantor. Xangai canta elomar é um disco que todos devem ter na sua coleção".